domingo, 12 de julho de 2009

Sobre manuais e personagens...

Pode parecer estranho, mas acabei de ler Divã porque não tive tempo de ir ao cinema para assistir ao filme. Sim, é muito estranho. Levei algumas horas para ler o livro, mas não tive tempo de ir ao cinema.

O fato é que li o livro em duas salas de embarque e em dois aviões. Foi rápido, mas li. E, mais uma vez, Martha Medeiros me surpreendeu. O livro todo é um relato de uma mulher, com mais de quarenta anos, ao seu psicanalista. Ou seja, tudo se passa em um divã. Li o livro com aquela pressa de quem gostaria de ter um dia com 36 horas. Acho que vou lê-lo de novo, somente para destacar tudo o que me fez refletir. Algumas passagens me marcaram. Vou compartilhar duas: “não nascemos com manual de instrução” e “liberdade para desresponsabilizar-se pelo próprio personagem”!

Nascer com manual de instrução seria perfeito para levarmos uma vida sem frios na barriga, sem surpresas, sem medos, sem dramas, sem frustações. Um horror! Já pensou? Na pré-escola, primeiro dia de aula: você chora porque sua mãe quer deixá-lo com um monte de estranhos num lugar mais estranho ainda. Sua mãe abre seu manual e lê: “filhinho querido, aqui diz que você vai entrar, chamar aquela moça parada ali de tia e aqueles serão os seus melhores amigos por toda a sua vida!” Então, você pequeninho diz “ah, então tá bom.” Entra na sala e já sabe direitinho o que deve fazer e o que virá. Na adolescência: você vê sua melhor amiga beijando seu namorado. “Ai meu Deus, o que eu faço agora?” Antes de ter um ataque de fúria, abre o manual, que poderá ter algo como: “erga a cabeça, despeça-se dos dois, e siga em frente linda e feliz!”. E na vida adulta? Deveriam existir muitos manuais (alguns acho que até já tentaram escrever). Alguns exemplos: “Como trabalhar para um imbecil”, “Como influenciar pessoas e fazer amigos”, “Trabalhe menos e viva mais”. Pensando bem, acho que esse é um mercado promissor, afinal, está cheio de manuais por aí.

Sou adepta do “não nasci pronta”, mas manual nenhum vai me falar o que devo fazer ou deixar de fazer para estar pronta. Penso que a vida é uma inconstância. Pelo menos, a minha parece ser. Posso querer uma coisa agora, mas mudar de idéia logo em seguida e considerá-la inútil, dispensável ou até idiota. E assim sou com as minhas crenças, minhas posições, minhas escolhas. Adoro essa efemeridade. Não que com isso eu não seja confiável. Tenho valores nos quais acredito. Apenas me identifico com o Maluco Beleza quando canta "prefiro ser essa metamorfose ambulante" e penso que tudo depende do ângulo que você vê o mundo.


Mesmo sendo alguém que considera que “o verdadeiro sucesso é viver a vida do seu próprio jeito”, acredito que criamos personagens para nos tornarmos mais adaptáveis à vida em sociedade. Quem não os cria? Talvez existam pessoas que não possuem consciência disso. Mas todas interpretam personagens. Não há como negar. Vivemos diariamente num grande espetáculo, pode ser em casa, no trabalho, na escola, no clube, e até na igreja. Então, como seria ter liberdade para desresponsabilizar-se pelo próprio personagem”? Matéria para a próxima postagem...

2 comentários:

  1. Fiquei com vontade de ler o livro ou de procurar o analista...

    Essa história da personagem é muuuito real. Ex-boazinha por exemplo, personagem que usamos para sobrevivermos neste mundo louco.

    O texto está muito bom, como sempre!!!!

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  2. Gauchinha... é muuuuuuuuitooo estranho....

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